A Palavra de Deus, no Domingo das Missões, alarga nosso olhar à dimensão do mundo e da humanidade. Com sua percepção universal dos fatos referentes a Israel, Isaías interpreta a decisão de Ciro, rei da Pérsia, como sendo a ação de um ungido do Senhor, ao abrir as portas ao povo eleito, libertado da Babilônia, marchasse em retorno, a fim de reedificar Jerusalém e reconstruir o templo. Diz do rei pagão: “Armei-te guerreiro, sem me reconheceres, para que todos saibam, do oriente ao ocidente, que fora de mim, outro não existe. Eu sou o Senhor, não há outro” (Is 45, 7- 6).
O salmo do dia convida todos os povos ao louvor, em uma liturgia festiva universal. Tal liturgia responde à profecia de Isaías: “Ó famílias das nações, dai ao Senhor poder e glória! Cantai ao Senhor Deus um canto novo, cantai ao Senhor Deus, ó terra inteira! Manifestai a sua glória entre as nações” (Sl 95).
Paulo, autêntico missionário entre os povos, reconhece que os filipenses participam “do número dos escolhidos”, pois o evangelho por ele anunciado “não chegou somente por meio de palavras, mas também mediante a força que é o Espírito Santo” (1 Fl 1, 4-5). Delineia os frutos de sua dedicação integral em colaboração com a graça divina, isto é, a aceitação dos ouvintes e praticantes. Por isso, agradece a Deus e, simultaneamente, “recorda sem cessar a atuação da fé, o esforço da caridade e a firmeza da esperança (dos filipenses), em nosso Senhor Jesus Cristo” (v. 2-3). Três virtudes teologais, expressas em relações recíprocas, evidenciam a missão concluída. A mesma alegria de Paulo é a de qualquer missionário quando planta, rega e, em seguida, colhe.
O Evangelho faz-nos refletir sobre a célebre assertiva de Jesus: “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Mt 22, 21). Pode ser interpretada também em chave missionária, forte e leve.
A chave forte é a da inserção da Igreja na história da humanidade com o devido discernimento à semelhança de Jesus. O Mestre não cai na armadilha dos fariseus e não entra na política de confronto com o poder universal de César a modo revolucionário, próprio do partido dos zelotes. Tampouco responde de modo evasivo ou espiritual para não se comprometer. Ao contrário, desmascara a armadilha dos “amantes do dinheiro” (Lc 16,14) que não queriam pagar imposto a Roma e pouco se importavam com a efígie blasfema do imperador na moeda. Diante da hipocrisia, Jesus reafirma seu ensinamento, por palavras e atos, a respeito da soberania do Reino de Deus ou dos Céus, dizendo: Dai a Deus o que é de Deus. Os fariseus entendiam muito bem o alcance da afirmação do Mestre.
A palavra de Jesus, tão incisiva, confirma a existência do Reino de Deus, agindo na história. Reino universal, ou seja, aberto a todos. Hoje, sem recorrermos às interpretações e às aplicações do passado, próprias do regime de cristandade (Igreja unida ao Estado), ou mesmo da roupagem moderna, em vigor, de independência e de mútua colaboração trata-se, sobretudo, da parceria solidária com a humanidade que sofre e não sabe e não tem a quem recorrer. É o âmbito no qual se configura e intensifica-se melhor a missão universal da Igreja, em saída e em diálogo, com o mundo do sofrimento humano. É o ministério da misericórdia com obras temporais e espirituais para as quais o Papa Francisco chama a atenção, vigorosa e repetidamente.
Os apelos dos empobrecidos ecoam por toda a parte. Os missionários respondem, em favor da promoção humana e da vida plena, da construção da cidade terrena, da paz social e pessoal, da preservação da natureza. Há sobretudo a resposta à fome de Deus, ao sentido da existência para a eternidade. Estes e outros contornos não são totalmente novos, mas reforçam o universo da missão.
Quanto à chave leve, é a de “dar a Deus o que é de Deus” mediante a Coleta pelas Missões, motivada pela fé e a caridade, pelo sentido de pertença e de corresponsabilidade à obra comum. Paulo escreveu seu “Deus lhes pague” aos filipenses: “Fizestes bem em compartilhar as minhas dificuldades. Meu Deus proverá esplendidamente com sua riqueza todas as vossas necessidades” (Fl 4, 14.19). Intensa há de ser também a oração pelos missionários (as). Sejam confortados e estimulados pela Igreja inteira!