Com os gregos que amavam a sabedoria, queremos subir a Jerusalém para conhecer e crer no Crucificado. Eles recorreram a Filipe: “Gostaríamos de ver Jesus” (Jo 12, 21). Este desejo, e pode ser o nosso, constitui o apelo da quinta semana de nossa Quaresma. Ele, ao revelar-se, se dá a conhecer mediante a ciência da Cruz. É preciso tirar o véu que a encobre. Arrancar o pano que cobre nossos olhos para não a ver. Abrir os ouvidos para sua mensagem iluminadora.
A palavra da Cruz segue a revelação, tal qual a profecia que tem em si a realização. No jogo do já e do ainda-não, Ele nos diz: “Chegou a hora em que o Filho do homem vai ser glorificado. Em verdade, em verdade vos digo, se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas se, morre, então produz muito fruto” (v. 23-24). Revela pelo paradoxo da morte iminente, sua glorificação nos frutos. A cruel morte não será inútil. Ela é a Sua Hora.
O segredo da morte brota no interior da prece a buscar sentido no abismo da perplexidade: “Agora, sinto-me angustiado. E que direi? Pai, livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim. Pai, glorifica o teu nome! ” (v. 27-28). A resposta do Pai à oração do Filho é a única voz capaz de explicar para Ele e a nós o paradoxo da morte: “Eu o glorifiquei e o glorificarei de novo! ” (v. 28) A hora da morte é, portanto, a hora da glória.
Outra afirmação paradoxal da glorificação na morte é: “quando for elevado da terra, atrairei todos a mim” (v. 32). Cruz que não afasta. Cruz que aproxima. Cruz-convergência.
Servimo-nos da meditação do bem-aventurado papa Paulo VI, em breve a ser canonizado. Ele aprofundou a palavra de Jesus sobre a contemplação que atrai o olhar convergente de todos.
“Sim, nós estamos olhando. Por mais atroz que seja a imagem de Jesus Crucificado, nós nos sentimos atraídos pelo Homem da dor; o calafrio horripilante que comumente suscita a visão do cadáver de um justificado todo em chagas e sangue, é superado por um fascínio singular, que fixa não só nossos olhos, mas ainda mais nossas almas sobre aquela figura “sem nenhuma beleza, nem esplendor” (cf. Is 53,2).Damo- nos conta, de repente, de estar diante de uma revelação que vai além da imagem sensível; a revelação intencional de um símbolo, de um tipo, de uma personificação extrema do sofrimento humano. Jesus, o Cristo, quis ser apresentado assim. Por que? Que exploração é oferecida à nossa piedade, à nossa ciência do homem, à nossa teologia! Não a podemos consumá-la aqui, mas apenas enunciar alguns pontos. Que a dor nos aparece consciente! A terrível paixão está prevista. A tortura e humilhação da Cruz eram sabidas. E foi querida na sua cruel inteireza até o fim, sem narcóticos habituais que mitigam nosso sofrimento, isto é, a ignorância do “se”, de “quando”, do “como” acontecerá ou o alívio piedoso e sapiente da arte médica. Jesus é aquele que “conhece a enfermidade” em toda sua extensão, em toda sua profundidade, em toda sua intensidade, em toda sua terribilidade, tanto de suar sangue na agonia espiritual do Getsêmani. E isto basta para torna-lo irmão de todo homem que chora e sofre, irmão maior, nosso irmão. Ele detém um primado, que centraliza nele a simpatia, a solidariedade, a comunhão com todo homem que padece”. (Via-Sacra da sexta-feira santa de 1970)
A meditação de Paulo VI é sabedoria e ciência da Cruz. Atinge à contemplação na mística do sofrimento do Redentor. Muitos santos e santas saborearam esta mesmíssima sabedoria na oração, no silêncio, na meditação, no contato vivo com a dor humana. Da mística elevada, mergulharam no abismo do mundo dos desvalidos e desprotegidos. Perceberam em Jesus, elevado na cruz, que o sofrimento humano se tornou coisa séria. Ele tem a ver com Deus, o Deus-solidário no amor. Não é cabível que um cristão banalize o mal e não supere a violência com a gratuidade do amor. Ao contrário, quanto mais ele convive com a solidariedade divina mais a caridade social se expressa pelo empenho político transformador, em prol de pessoas e de grupos violentados. Da mística à ética. Por isso, a Campanha da Fraternidade é como é.