Em março deste tenebroso ano de 2020, o padre italiano, Giuseppe Berardelli, de 72 anos morreu, vítima do COVID-19. Recusou o respirador que seus amigos lhe tinham presenteado para cedê-lo a um jovem paciente. Herói ou mártir da caridade, ele morreu como viveu: para os outros! Sua última hora foi a de amar no dom gratuito de si…
O gesto do padre faz-nos lembrar que a História da Igreja é também a história da solidariedade de tantos cristãos anônimos, em tempo de epidemias e de carestia. Foi exemplar sua atitude quando a peste e os saques se espalharam pelo Império Romano, de 249 a 263. Em Roma, morreram em um só dia cinco mil pessoas. Em Alexandria, no ano de 261, cadáveres jaziam nas ruas e o odor era insuportável. Foram os cristãos que viviam escondidos, devido à perseguição, que saíram a fazer as obras de misericórdia. Lavaram os corpos dos seus inimigos, levaram-nos nos ombros e os sepultaram dignamente. Muitos foram até contagiados.
O tempo da peste, em Milão, durou desde o verão de 1576 até o começo de 1578. O Hospital de São Gregório estava em situação precária, superlotado de doentes e mortos. Em lágrimas, o Cardeal-Arcebispo, São Carlos Borromeu, diante da recusa do clero milanês, mandou vir sacerdotes e leigos dos vales alpinos para socorrer os doentes e famintos. Construiu abrigos provisórios. Ergueu altares ao longo das ruas para que os doentes assistissem a missa sem saírem de suas casas. Além de prestar socorro material com os próprios recursos, administrava a unção dos enfermos. Não temia o contágio.
Na Itália da atual pandemia, as primeiras freiras infectadas só podiam ser camilianas. Isto porque São Camilo é o fundador da Ordem dos Enfermos. Em 1588, com seis companheiros fundou uma casa, em Nápoles. Algumas galeras, com tripulação infectada pela peste, foram proibidas de entrar no porto. Os camilianos, recém-chegados, subiram a bordo para dar assistência aos pestilentos. São Camilo demonstrou a mesma caridade quando uma febre eliminava muitos romanos.
Outra epidemia de peste fez estragos em Roma, em 1591. Os jesuítas abriram um hospital no qual muitos membros da Companhia prestaram serviços, inclusive o Geral. O mais conhecido é São Luís Gonzaga que faleceu, acometido de febre persistente.
Em 1660, morreu o padre francês, São Vicente de Paulo. Antes, porém, organizou amplas instituições de caridade com Santa Luísa de Marillac. A respeito da residência das Irmãs, dizia: “é o quarto dos doentes; sua capela, a igreja paroquial; seu claustro, as ruas da cidade”. Com presença delas na geografia do sofrimento, a história católica da caridade organizada é descrita. Trata-se da solicitude feminina cristã junto aos atingidos pelos horrores das guerras, das epidemias e de tantas doenças infecciosas.
Homens e mulheres tiveram e têm iniciativas de socorrer os demais com o bálsamo da caridade por amor a Cristo. Haja vista, o exemplo recente de nossa Santa Dulce dos Pobres que ia às ruas recolher mendigos e enfermos. Construiu-lhes um hospital.
A miséria, em geral, e a pandemia do COVID-19, no momento, não provocam apenas a fé. Estimulam a caridade e a justiça. Aliás, é a caridade que sempre purifica e liberta a fé para pequenas, grandes e nobres ações de amor. “A fé se não tiver obras, está morta em seu isolamento” (Tg 2, 17). Só as obras do amor derrubam os muros das separações.
Obrigado, por mos relembrar essa história de dor e amor incondicional.
Um primor!
O autor (Dom Edson) evoca diversos momentos sombrios por que já passou a humanidade, pondo em relevo o que, de fato, em tais circunstâncias, apresenta-se como algo fundamental: o exercício da caridade, tendo, como base, o “Novo Mandamento”, anunciado, e praticado, por Nosso Senhor: “Amai-vos uns aos outros!”.