O domingo da Santíssima Trindade nos convida e até nos obriga a falar sobre Deus, sob a ótica da Revelação do Mistério. A dificuldade não está na Trindade em si ou na Trindade para nós. A dificuldade reside, provavelmente, no nosso discurso humano com a pobreza de nossas imagens e metáforas, como a de insistir no triângulo ou usar as três velas acesas que acendem a apagada para explicar três em um. Tais gestos falariam ao intelecto, nada dizem ao coração.
Lucas comunica relacionamentos de amor. O anjo visita à Virgem para dizer-lhe que o Pai a escolhera, o Espírito Santo viria sobre ela e o Menino dela nasceria, chamado Filho do Altíssimo e Deus-conosco. A linguagem é toda trinitária. Também Jesus é narrado a modo trinitário: o Pai envia-lhe o Espírito em forma de pomba. Diz e tudo opera pelo Amor Divino.
Paulo, ao compreender que a Trindade é relação, saúda de modo trinitário os destinatários: “A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós” (2 Cor 13, 13). A Igreja faz o mesmo, ao início de cada celebração eucarística, para que a assembleia do culto a Deus sinta-se em relacionamento reciproco de amor e paz.
Falar de Deus de modo responsável, hoje, é problemático. Herdamos o progressivo afastamento desse discurso na filosofia, na ética, na ciência, na arte. O sagrado é ridicularizado ou infantilizado em certos setores. Pessoas se declaram ateias ou aderem ao ateísmo postulado e programado. Muitos já não têm religião ou dela se desvincularam. No século 20, tivemos políticas de propaganda ateia e de perseguição religiosa sistemática. Ironia de Deus, a Nação que aboliu a religião viu nascer Santa Teresa que quis ser de Calcutá. Apresentou um discurso prático sobre o Deus que vive ao lado e junto aos miseráveis. Tivemos, naquele século, papas santos, além de homens e mulheres confessores da fé e muitos mártires. São João Paulo II avaliara: “um século de mártires”. De fato: a fé e a caridade deram vida a tantos adoradores.
Surpreendentemente, em meio a uma sociedade secularizada, Deus e deuses continuam objeto do discurso. Criam-se novas religiões, novas seitas e novos cultos. A oferta e a procura são variadas. Em plena cultura do simulacro e do consumo, as religiões produzem dinheiro e votos e adeptos e igrejas eletrônicas. A situação aponta para a sede e a fome de Deus em muitos.
Urge, pois, anunciar, o Mistério que tirou seu véu e revelou-se e se revela. É o que nos proporciona a boa reflexão do domingo da Trindade: ir para encontrar. Vamos, pois, até o Israel bíblico, ao Deus do Êxodo, da Lei, da Aliança que se deixa alcançar pelo grito de Moisés: “Senhor, Senhor! Deus misericordioso e clemente, paciente, rico em bondade e fiel” (Ex 34, 6); Caminha com a gente que somos de cabeça dura (v. 9). Vamos até Jesus que veio e vem a nós, pois, “Deus enviou seu Filho ao mundo para que o mundo seja salvo por Ele” (Jo 3,17). Vamos ao Espírito que quer conduzir-nos à verdade plena (Jo 16,13). Enfim, sendo Deus, amor comunicante e gratuito, criou-nos capazes de encontra-lo e de nos comunicarmos com Ele. Quem o busca e encontra, cultiva a dimensão trinitária na vida familiar, social e eclesial, favorecendo a comunhão na diversidade e promovendo a unidade na pluralidade pelo diálogo.