OLHAR O HORIZONTE

Impressiona o fato que os apóstolos continuavam olhando para o céu, enquanto Jesus subia. Porém, os anjos celestes lhes perguntaram: “por que ficais parados, olhando para o céu? ” (At 1, 10-11). A pergunta é dirigida também a nós na celebração da Ascensão do Senhor.

É preciso manter a expectativa do retorno: Ele “virá do mesmo modo como o vistes partir para o céu”. Significa que faz parte da Mensagem a segunda vinda de Jesus cuja expectativa nos move a viver a fé com a esperança, no mundo presente a ser humanizado por nosso amor.

Olhar o horizonte é ter a percepção da universalidade da missão que se descortina, pois no nome de Jesus, “serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém” (Lc 24,47). É fundamental o vínculo apostólico porque os Doze autenticam a missão da Igreja, desde o início: “Vós sois testemunhas disso” (v. 48).  

“Eis que eu vos enviarei o que meu Pai prometeu” (v. 49). O Pai envia pelo Filho o Espírito Santo em favor do cumprimento da promessa.  Por isso, a subida de Jesus corresponde à descida do Espírito para que a obra do Filho continue na Igreja e através dela, no serviço da palavra, da liturgia e do testemunho da caridade. O horizonte da Igreja é a extensão do Reino.

O Espírito Santo permite olhar o horizonte do destino e do futuro do homem e da mulher em todos os tempos. Desde a terra onde estamos é que nosso olhar se amplia. Muito importante pisar o chão da existência, a realidade da vida, a dimensão da história que avança. O chão da terra é o lugar, o espaço com tudo que comporta. O horizonte é o tempo, o tempo maior que se amplia, mas também o tempo menor de cada um. No entanto, pode ser ampliado por uma vida digna de si, santa, justa e solidária com a graça do Espírito que tudo vivifica e renova.

A terra e o horizonte do tempo não bastam. Queremos mais. Somos inquietos enquanto não repousarmos em Deus, disse Agostinho. De fato, o horizonte do desejo humano vai além do tempo, além do fim, além da morte. Preanuncia a volta do Senhor, ainda que sempre indefinida, sem data, sem previsão. É desejo da vitória da vida, da justiça e do amor.

A Ascensão nos diz da ultrapassagem daqui para o encontro com o Mistério de Deus. Eleva-nos sem tirar-nos do caminhar terreno pela aspiração do Sentido último, dom e acolhida.  Jesus disse que nos preparou este “lugar”. O Espírito derramado é o “passaporte” de entrada. Somos do pó da terra, feitos de carne, mas aspiramos as alturas dos céus de Deus. Transcendemos.

“Está sentado à direita de Deus”. Esta metáfora diz respeito somente a Jesus. Esta honra lhe pertence. Entrou na sua glória, exaltado pelo Pai porque se humilhou até a morte por nós. Em contrapartida, enche-nos de santa ousadia, a da “esperança que não engana nem decepciona”. Chegaremos lá onde nosso Redentor se encontra. Encontraremos aberta a porta da Vida.

A propósito, no recente dia 28 de maio, o estimado Papa Emérito Bento XVI, celebrou 42 anos de sua ordenação episcopal. Teólogo, este sim de largo horizonte, põe-nos na via ascensional até as alturas do Mistério. Entrevistado por Peter Seewald se é possível se preparar para a morte, não desconversou: “É até mesmo necessário, penso eu. Não no sentido de que agora a pessoa precisa realizar determinados atos, mas viver a partir de então o seu íntimo para que passa na última prova diante de Deus. Para que a pessoa saia deste mundo e fique diante D’ele e dos santos, e dos amigos e daqueles que não foram amigos. Para que, digamos, aceite a finitude desta vida e se aproxime intimamente para se apresentar diante de Deus”. Enfim, concluiu com reta intenção: “que eu viva na consciência de que a vida toda tende para um encontro”. Quase ao término, ele mantém seu olhar vivo, atento a um horizonte ampliado.

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