Iniciamos a semana santa com o domingo de Ramos e da Paixão. Neste ano de 2016, a leitura do Evangelho é segundo São Lucas. Será, mais uma vez, anunciado que o coração misericordioso de Jesus supera a justiça, realizando-a, plenamente, pelo perdão.
A justiça que excede, ou a plena justiça, é a misericórdia que perdoa e premia o ladrão que crê: “Eu te digo, hoje, estarás comigo no Paraíso” (Lc 23, 43). Diz muito de nós, necessitados de misericórdia e de perdão e de reconciliação.
O evangelista nos faz contemplar a cena derradeira na cruz como tribunal. O Justo e Inocente é acusado e sentenciado à morte mais cruel e mais humilhante e mais infame. Injustamente.
Quem O inocenta é um ladrão. Ele é verdadeiro: reconhece sua culpa e a de seu companheiro e defende a inocência de Jesus: “Quanto a nós, é de justiça: estamos pagando por nossos atos; mas ele não fez nenhum mal” (v. 41). É o único a representar um juiz isento, inocentando o Justo. Assim, aponta o erro e a malicia de todo o processo. O paradoxo chega a ser burlesco.
Acertadamente, Rui Barbosa, nosso célebre jurista, afirmou que Jesus passou por três tribunais e em nenhum teve um juiz. De fato, Jesus só conheceu acusadores e as falsas testemunhas.
Outro paradoxo: o ladrão é por Jesus, perdoado. Perdoado, não porque fosse bom, mas porque acreditou e desejou na fé o que suplicou: “Jesus, lembra-te de mim, quando vieres com teu reino” (v. 42). O perdão realça a culpa. Não inocenta. Porém, o perdão expressa o poder divino de Jesus, em surpreendente ato de amor: “Hoje estarás comigo ” (v. 43).
Um pagão, centurião romano, reconheceu: “Realmente, este homem era um justo!” (v. 47). Mas o diz após a morte, tarde demais, pensamos. Porém, antes tarde do que nunca. Na verdade, nunca é tarde para ser agraciado com o perdão: é o que nos diz o “bom” ladrão.
O evangelista da misericórdia põe a cena conclusiva numa liturgia penitencial, na qual a assembleia reconhece sua participação na morte do Inocente: “Toda a multidão que havia acorrido para o espetáculo, vendo o que havia acontecido, voltou, batendo no peito” (v. 48).
Nestes dias, a Igreja revê o drama da Paixão e Morte, na liturgia e na devoção. Não pode ser apenas um espetáculo até encenado, mas sem consequência. Por isso, os verdadeiros fiéis ou discípulos batem no peito, após ouvirem a oração de Jesus: “Pai, perdoa-lhes: não sabem o que fazem” (v. 34). Esta oração nos inclui. O perdão desejado é doado do Pai pelo Filho. A misericórdia nos alcança: “A justiça de Deus que opera pela fé em Jesus Cristo” (Rm 3, 22) se manifestou (v. 21).
Na semana santa, o cristianismo revive e atualiza, na pregação e na celebração, o que tem de melhor: Jesus, a misericórdia do Pai. Ele, o ápice do Evangelho, a boa notícia viva da nossa salvação. Ele, o único Redentor. Atrai todos a si (Jo 12, 32) e estabelece a Igreja como pátria universal do perdão (Jo 20, 23).
Que nossa Igreja diocesana, os que estão perto e os que se sentem distantes, celebre os acontecimentos da redenção e da reconciliação com fervor! Para tanto, desejo a todos uma semana santa bem frutuosa.
Dom Edson de Castro Homem
Bispo Diocesano de Iguatu